sábado, 22 de novembro de 2008

A CRUZ MUTILADA


Amo-te, ó cruz, no vértice, firmada
De esplêndidas igrejas;
Amo-te quando à noite, sobre a campa,
Junto ao cipreste alvejas;
Amo-te sobre o altar, onde, entre incensos,
As preces te rodeiam;
Amo-te quando em préstito festivo
As multidões te hasteiam;
Amo-te erguida no cruzeiro antigo,
No adro do presbitério,
Ou quando o morto, impressa no ataúde,
Guias ao cemitério;
Amo-te, ó cruz, até, quando no vale
Negrejas triste e só,
Núncia do crime, a que deveu a terra
Do assassinado o pó:
Porém guando mais te amo,
Ó cruz do meu Senhor,
É, se te encontro à tarde,
Antes de o Sol se pôr,
Na clareira da serra,
Que o arvoredo assombra,
Quando à luz que fenece
Se estira a tua sombra,
E o dia últimos raios
Com o luar mistura,
E o seu hino da tarde
O pinheiral murmura.
ALEXANDRE HERCULANO

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

CAVALEIRO DE CRISTO!

Os Portugueses, senhores do campo, celebravam com prantos a vitória.
Poucos havia que não estivessem feridos; nenhum que não tivesse as armas
falsadas e rotas. O Lidador e os demais cavaleiros de grande conta que naquela
jornada tinham acabado, atravessados em cima dos ginetes, foram conduzidos a Beja. Após aquele tristíssimo préstito, iam os cavaleiros a passo lento, e um
sacerdote Templário, que fora na cavalgada, com a espada cheia de sangue metida
na bainha, salmodeava em voz baixa aquelas palavras do livro da Sabedoria:
"Justorum autem animae in manu Dei sunt, et non tangent illos tormentummortis".

A Morte do Lidador - Alexandre Herculano


segunda-feira, 17 de novembro de 2008

TRÉGUA

Agora a noite é nossa, fala baixo oh borboleta, findaram os combates nas ruínas.
Entrega ao arvoredo a cor que é do teu corpo, abandona os mistérios de menina.
Já se ouve a cascata no monte menina, perto da gruta renasceu.
Já se ouve o murmurar do lago onde há pouco o luar, cansado adormeceu.
Vejo sombras calmas na montanha menina, sonho o teu corpo a naufragar.
Já perdi o medo do tempo que é tempo de perder, com medo de te amar.
Agora a noite é nossa, fala baixo oh borboleta, findaram os combates nas ruínas.
Entrega ao arvoredo a cor que é do teu corpo, abandona os mistérios de menina.
Já se ouve a cascata no monte menina, perto da gruta renasceu.
Já se ouve o murmurar do lago onde há pouco o luar, cansado adormeceu.
Deixa que os cavalos se afastem menina, já não vês lanças a brilhar.
Agora que a noite nos deu trégua, é tempo de uma noite, sem trégua para te amar.
Agora a noite é nossa, fala baixo oh borboleta, findaram os combates nas ruínas.
Entrega ao arvoredo a cor que é do teu corpo, abandona os mistérios de menina.

QUADRILHA - letra